domingo, 7 de maio de 2017

Retorno (?)





1.
Não escrevo há mais ou menos dois anos, mas há dois anos os temas, as angústias, as dúvidas, as reflexões, as inquietações, os medos, as raivas passam pela minha cabeça. Acho que deixei de escrever porque me acomodei, porque a solidão não parecia tão presente e a vida parecia certa, porque na minha cabeça não havia motivos para escrever. Não?
Não escrevo há mais ou menos dois anos porque há dois anos a minha vida mudou por completo, a única coisa que não mudou foi a minha família. Além disso, tudo foi e é mutável. Eu mudei, inclusive, e como mudei. A eu de três anos atrás fez sentido, porém tenho dó e carinho por ela, toda perspectiva era diferente.
Não escrevo há mais ou menos dois anos porque há dois anos eu comecei a ter contato com pessoas que fazem as melhores reflexões e desabafos que já li, eu me senti pequena demais. Eu passei a absorver desde produzir, junto com o fato de que meu público leitor mudou por completo, se é que ele ainda existe, e é muito difícil aceitar que eles podem verdadeiramente me ver. Me ler. Entretanto me culpo por privá-los, afinal, eles acham que me conhecem.
Não escrevo há mais ou menos dois anos mas eu nunca deveria ter parado de escrever. Esses dias voltando do trabalho às cinco da tarde, saindo do ônibus lotado para ir para a casa, a ficha caiu. A fita de toda mudança ocorrida há dois anos passa quase que diariamente na minha cabeça, e todo dia a perspectiva muda. Eu não escrevi sobre isso, eu não registrei as passagens, eu perdi dois anos de reflexões das principais mudanças da minha vida. A minha cabeça pede sempre para que eu escreva, eu me vejo escrevendo e criando mentalmente os textos, e no final eu não escrevi nenhum deles. Que raiva que eu sinto de mim.

2.
Eu sinto muita raiva. Eu sinto também muita euforia, fico muito calma e depois sinto muita raiva. Eu não consigo mais lidar comigo porque minhas mudanças de humor são radicais e incontroláveis.
Li esses dias uma matéria cujo título era “Sinais de que você está desconectado de si mesmo” e basicamente o que eu lembro bem porque foi onde me vi foram em “você não escreve mais” e “você tem mudanças radicais de humor”. Tem dias que eu tenho tanta raiva que eu me recuso a conversar, olhar ou cumprimentar as pessoas porque eu sinto que posso perder o controle e começar a gritar e despejar tudo em cima delas, coitadas, que nada tem a ver. É tanta raiva que eu penso o quanto gostaria de sumir do mundo, de nunca mais ver as pessoas, do quanto eu queria que todos fossem mudos, eu acho que nunca mais vou conseguir falar e não sentir raiva dos outros.
Porém tem dias que a maré fica calma. Eu converso, eu pergunto, eu me interesso (ou me esforço para), eu penso “como que eu fiquei tão raivosa esses dias? meu deus, que bizarro, não faz sentido nenhum aquela raiva. acho que era mau humor”. As pessoas que convivem comigo definitivamente devem achar que eu tenho algum problema, e não culpo elas. Era mau humor? Eu ainda não sei. Só sei que existe essa sombra dentro de mim que do nada desperta e rasga tudo que vê pela frente, uma bomba relógio que eu não sei desativar, só abafar.

3.
Eu tenho muito que escrever.
Eu quero escrever sobre meu humor, sobre morar sozinha, sobre estar sozinha, sobre São Paulo, sobre a faculdade, sobre as bolhas nas quais vivos e sou obrigada a estourar diariamente, sobre o quão é difícil lidar com pessoas, sobre o quanto eu apanho diariamente e perco minhas verdades para o dia a dia, sobre o quanto eu tenho mudado diariamente, sobre minhas novas ideias e vontades, sobre o quanto eu quero fazer e realizar o mundo em um dia, sobre o quanto eu quero vegetar e ser inútil no outro, sobre dormir, sobre ser caseira, sobre querer ter um gato, sobre minha organização e como isso afeta minha vida, sobre meus medos, sobre as coisas bizarras que passam na minha cabeça, sobre lidar com diferenças e opiniões divergentes, o quanto alguns sentimentos e verdades não mudam há muito tempo e isso me conforta porque ainda me reconheço, o quanto algumas coisas mudaram e isso me chateia. Quero escrever sobre a Beyoncé, sobre séries que vi, sobre feminismo, sobre machismo, sobre a desigualdade e competição diária, sobre as culpas que sinto, sobre meu trabalho, sobre o que quero, sobre o que não quero, sobre tudo que me afeta e me descontrola ou controla diariamente. O quanto o tempo está passando, eu já estou com vinte e dois e ainda não sei noventa por cento do futuro e do que fazer com ele. Do quanto eu sei que daqui oito anos provavelmente tudo que eu acho, vai mudar.
Eu tenho muito o que escrever.

4.
Esse tópico é adicional e me veio à cabeça agora mesmo, enquanto eu escrevi sobre estar desconectada de mim. Rapidamente me veio na cabeça dois hábitos que eu perdi há dois anos e que por quase oito anos me guiou e me centrou: escrever e ler.
Se eu entrar em contato com qualquer pessoa que conviveu comigo antes de dois anos atrás e perguntar meus principais hábitos e hobbies, elas dirão leitura e escrita. Se eu pedir para meus conhecidos de dois ano para cá me relacionar com leitura e escrita, eu terei como respostas caras de interrogação. Mais uma vez, a culpa não é deles.
Da mesma maneira que os temas e os textos surgem na minha cabeça pedindo para serem escritos, as minhas personagens preferidas, meus livros preferidos, as análises e perspectivas que sempre me ajudam, também surgem. Eu me vejo analisando pessoas, lugares, situações na mesma narração que minha amada Rowling, ou vejo meu medos narrados por Stephen King. Eu também parei com a literatura, há dois anos não abro um livro, mas continuo pensando e agindo como um.
Faz todo sentido eu me sentir meio fora do controle, meio distante de mim. Eu preciso voltar a escrever e ler, a ler tudo que eu lia há sete anos, com a maturidade e conhecimento de hoje. Preciso ler o que eu tenho vontade de ler, preciso ler os livros que comprei e estão na espera, preciso largar o celular e ler. Sair da internet e ler um livro é tão 2006. Que saudades de 2006.
Escrever é tão bom que tive dois insights durante esse texto. O primeiro: percebi o quão difícil tem sido escrever sem ser repetitiva e pobre, eu não sei mais me expressar e organizar em palavras. O segundo: vou voltar a escrever e ler.

Nenhum comentário:

Postar um comentário